sexta-feira, 22 de fevereiro de 2013

As contradições na hora de educar

Ontem não foi a primeira vez que minha filha me deu uma lição de moral, mas foi uma das que me deixaram mais reflexiva. E me fez sentir mal. Enquanto nos arrumávamos para ir ao teatro, ela não parava quieta. Parecia um surto daqueles que a criança quer mexer em tudo, derrubar tudo, bagunçar o cabelo já pronto, se esfregar no chão com o vestido novo... aquela velha novela.

Então eu fui me irritando e disse que ela já poderia parar de 'encher o saco'. E ela disse que quem estava enchendo o saco era eu. Na hora, me senti desrespeitada na autoridade de mãe e disse que ela parasse de me responder, senão ela iria apanhar antes mesmo de sair de casa. E ela novamente respondeu, dizendo que eu é quem merecia apanhar - e dela! Então eu disse que ela estava passando dos limites e dei um tapa no ombro - desses que a gente já dá com pena.

Pelo escândalo que ela fez, tenho certeza que ela estava muito mais ofendida pela falta de autoridade em revidar do que pelo tapa em si. E então o clima ficou tenso. Ela não parava de chorar e eu não conseguia me acalmar com os gritos dela, que continuava tentando chamar a minha atenção.

Enfim, quando ela parou de chorar e de gritar, fui conversar com ela num tom mais calmo, sem deixar de ser ríspida. Disse que o comportamento dela era muito feio, que ela estava agindo como uma menina boba e que isso me deixava muito chateada. Ela ficou calada, olhando nos meus olhos com cara de ofendida (como sempre faz). E depois que eu terminei de falar, ela disse:

- Eu também fiquei chateada! 

Eu ressaltei que ela estava chateada por uma situação que ela havia começado, por não se comportar e nem me ouvir na hora que eu falo. Disse que havia ficado chateada com a forma como ela tinha falado comigo e que é muito feio gritar com a mãe. E perguntei:

- Você promete que não vai mais gritar com a mamãe?

E ela respondeu, para meu espanto:

- Certo. E você também, né mãe?

Na hora pensei em dizer que eu tinha o direito de gritar o quanto eu quisesse, porque eu era a mãe, e ela uma criança de apenas dois anos. Mas ela estava certa. A minha posição de mãe não me eximia de me controlar e tratá-la da forma como ela se sente respeitada. Na hora do nervosismo, dificilmente pensamos bem antes de falar, e acabamos exagerando na rispidez e no tom de voz. E não nos perguntamos o quanto isso pode ofendê-los. Me arrependi de ter dito que 'ela estava enchendo o saco', porque percebi que foi isso que a havia magoado. E então eu percebi que eu estava procurando um motivo para me eximir da culpa por ter causado a briga, que se inflamou não pela inquietação dela, mas pela minha reação. Então eu disse:

- Tá certo... nenhuma de nós duas pode gritar com a outra, vamos sempre conversar com calma, né?
- É...
- Certo. Mas você tem que me pedir desculpas, porque eu fiquei chateada com a maneira como você falou comigo.
- Desculpa, mãe... 

Nos abraçamos e eu refleti sobre como de certa forma eu também estava sendo autoritária e arrogante com ela. Confundindo autoridade com autoritarismo. Mas, depois de alguns segundos, ela disse:

- Você também me 'peda' desculpas, mãe... 

E então eu pedi, segurando o riso. Achei e sempre acho impressionante o quanto ela não se submete, nem sob pressão. O interessante é que ensinamos as coisas de uma forma para a criança e nos comportamos de outra. Em vários outros momentos, eu já havia dado algumas broncas nela e quando eu subia o tom de voz, ela sempre dizia:

- Mãe, fale baixo... não precisa gritar.

Sempre achei uma ousadia da parte dela, mas dessa vez eu percebi que ela enxerga a nossa relação com os olhos da coerência e da igualdade. O que vale para uma, também vale para a outra. E que, antes de exercemos nossa autoridade, a gente tem que pensar mais em nossos erros também. Pais e mães falham, isso é normal. E temos dificuldade de mostrar isso aos filhos, de pedir desculpas e se retratar. Mas exigimos isso deles. Eu exigi que ela me pedisse desculpas, mas na cabeça dela eu também tinha que pedir. E ela estava certa. 

Na hora nos sentimos invadidos e desautorizados, mas é preciso educar com coerência. E logo eu, que sempre fui contra a máxima de "eu posso porque sou sua mãe", me flagrei diante de uma contradição. Mas nós conversamos, pedimos desculpas uma à outra, nos abraçamos e depois saímos. E prometemos mudar, claro. 


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