Depois de duas semanas de molho em casa, por conta da catapora, percebi que Maria Joana estava ávida por passeios na rua. Só o fato de voltar à escola já era motivo de empolgação para ela, que já me chamava até para comprar pão. Então, numa dessas tardes em que fui buscá-la, decidi passar na praça pra dar uma volta e demos de cara com um pula-pula - R$ 2,00 a cada oito minutos. Deixei ela pulando por 16 minutos e então, a muito custo, consegui convencê-la a ir para casa.
No meio do caminho, passamos por uma igreja e ela imediatamente começou o diálogo:
- Mãe, o que é isso?
- É uma igreja, meu bem...
- E o que é uma igreja?
(Silêncio de 2 segundos)
- É a casa de Deus, minha filha.
- Eu queria tanto entrar na casa de Deus...
A porta estava aberta... pensei: "Não custa nada, né".
- Vamos, podemos entrar sim. Deus é bonzinho, ele deixa.
Entramos. Não satisfeita,
- Mãe, eu quero me sentar.
- Tá certo, vamos sentar.
Maria Joana então juntou as mãos como se fosse rezar, fechou os olhos, mas logo em seguida abriu. Olhou para os lados com ar de estranhamento e perguntou mais uma:
- Mãe, quem se senta aqui?
- Ora, todo mundo. Qualquer pessoa que quer conversar com Deus vem à casa dele, se senta aqui e conversa com ele.
Novamente ela olhou para os lados, olhou para o chão, levantou os pés e olhou para baixo do sapato e continuou procurando eternamente alguma coisa...
- Deus... Deus... Deus? DDEEEEEUUUUUUUSSSSSSS!!!!
- Minha filha, o que é isso? Você não pode gritar aqui, tem que falar baixinho...
- Mãe... eu tô procurando Deus. Cadê ele? Eu quero conversar com ele e não tô vendo ele...
Depois de uma crise de riso, eu realmente não sabia o que dizer e disse que estava na hora de irmos pra casa. A única coisa que me passou pela cabeça foi dizer a ela que ela realmente não podia ver Deus, mas sempre que ela quisesse conversar com ele, seria ouvida. Mas acho que não adiantou muito. Durante todo o caminho de volta, ela procurou por Deus em todos os lugares, em cada árvore, nas esquinas...
Não é só sobre maternidade. É sobre paternidade, autonomia, educação, direitos humanos, políticas públicas, saúde, economia, adoção, direitos reprodutivos, mercado de trabalho, feminismo e relações sociais. Acima de tudo, é sobre uma questão de escolha: a escolha de ser mulher e mãe.
terça-feira, 23 de abril de 2013
sexta-feira, 12 de abril de 2013
As representações das relações e da vida
A correria do dia a dia raramente nos permite observar e compreender as impressões que as crianças adquirem do mundo ao seu redor e as diferentes maneiras com que elas representam e exprimem essa realidade. Há algum tempo, Maria Joana anda com o hábito de 'trocar os papéis'. Quando ela brinca com as bonecas, sempre se comporta como se fosse eu, pede pra ser chamada de 'mãe Priscila' e fala com as bonecas da mesma forma que eu falo com ela.
Dá comida, dá remédios, acalma o choro das bonecas, coloca para dormir... tudo como manda o roteiro materno diário. Então, passei a fazer parte dessa troca de papéis e comecei a agir como ela. Pedia à 'mamãe Priscila' para comer e, quando ela chegava com a comida, eu fazia um escândalo e dizia que não queria as batatas, gritava quando ela queria me dar remédios e sempre enrolava quando ela ia me colocar para dormir.
'Minha mãe' me colocando pra dormir |
No início, eu achei que ela iria se chatear e não querer mais brincar. No entanto, me surpreendi. Até nos momentos mais 'críticos', ela procurava lidar com 'meus escândalos' da mesma maneira que eu falava com ela. Sempre que eles estão perdidos em meio à birra, achamos que eles não ouvem o que a gente fala na tentativa de acalmá-los, mas percebi que eles não só ouvem, como representam a cena.
Era difícil conter o riso quando ela dizia comigo:
- Calma, Maria Joana.. tem que tomar tudo pra melhorar.
Passei então a exercer essa inversão de papeis para que ela pudesse compreender as emoções, os dilemas e até mesmo o estresse que permeiam a nossa relação. Acho que é saudável para exercitar o 'se colocar no lugar do outro', para ambas.
No entanto, essa semana eu me surpreendi. Com a chegada da catapora e o molho de vários dias em casa, ela demonstrou bastante inquietação. Me chamava pra ir à escola, pra andar de bicicleta, passear etc. É difícil distrair uma criança de 2 anos e meio quando ela está em casa entediada e agoniada para voltar à rotina de antes.
'Tia Renata' dando aula |
Quando eu entregava alguns livrinhos, cadernos e materiais de pintura pra ela brincar, ela então encarnava a representação das relações escolares - claro que no papel da autoridade. Ela me dizia que era a 'tia Renata' (a pedagoga da turminha dela) e que eu era Clarinha (uma das colegas de turma que ela mais gosta).
Passei horas sendo cobaia das vontades da 'tia Renata'. Ela me mandava fazer fila para o lanchinho - sempre atrás dela -, tomar remédios, fazer corações e estrelas, pintar na linha, escrever meu nome etc. É claro que eu não simplifiquei. Me recusei a fazer as atividades, a tomar os remédios, a todo momento dizia que queria falar com a minha mãe, que queria ir embora e cheguei a 'bater no coleguinha' - um sapo verde que estava ao meu lado na turma.
Que pena que eu não consegui filmar. A 'tia Renata' era realmente uma pedagoga. Me chamou pra conversar num canto e disse que eu não podia bater no coleguinha, me fez pedir desculpas e dar um abraço. Disse pacientemente que não era o momento de eu falar com a minha mãe e que ela iria me pegar depois do almoço. Quando eu me recusei a fazer a atividade, forcei um choro e propositalmente disse:
- Tia, eu não consigo, eu sou uma burra.
E, para meu espanto, ela realmente havia encarnado a pedagoga:
- Não, não diga isso... (balançando a cabeça para os lados). Você não é burra, você vai conseguir. Vamos, eu te ajudo.
'Tia Renata' ensinando a atividade. Logo atrás, a fila do lanche |
Pegou na minha mão e fez um coração comigo no papel (meio torto, claro).
Mas o que mais me espantou foi a maneira como ela falava e os gestos - totalmente iguais aos da tia da escola. A partir de então eu compreendi o quanto é saudável esse exercício de trocar os papéis, até mesmo para perceber de que maneira a criança está percebendo o mundo e as pessoas ao seu redor. É nessa brincadeira que ela se expressa e expressa os acontecimentos à sua maneira.
Além disso, é uma oportunidade para conhecer melhor também as relações que seu filho mantém fora de casa - na escola, com os amigos etc. Não sei o que os psicólogos infantis dizem com relação a isso, mas estou gostando dessa experiência e sempre que brincamos, interpretamos personagens ao nosso redor. E tem sido muito bom para as duas.
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terça-feira, 2 de abril de 2013
Tudo azul!
Imagem: Blog Psicologia em desfoco |
O autismo é uma palavra de origem grega (autós), que significa “por si mesmo” e é um termo utilizado para denominar comportamentos humanos voltados para o próprio indivíduo. O transtorno de desenvolvimento se manifesta na infância e afeta a comunicação e o comportamento da criança, trazendo, principalmente, dificuldades na fala e na interação com outras pessoas.
Com a crescente disseminação das informações relacionadas ao transtorno, o preconceito vem dando lugar ao diagnóstico e consequente tratamento. Dados do Centro Nacional de Saúde e Estatística dos Estados Unidos mostram que de 2011 para cá, o número de crianças diagnosticadas com a desordem do espectro autista (DEA) é de uma em cada 50. No Brasil, não existem medições oficiais, mas a estimativa é de que haja mais de um milhão de pessoas com o problema.
Elevador Lacerda, na BahiaFoto: Blog Psicologia em desfoco |
De acordo com o “Diagnostic and Statistical Manual of Mental Disorders” (DSM IV), as características essenciais do Transtorno Autista são: presença de um desenvolvimento acentuadamente anormal ou prejudicado na interação social e na comunicação, e um repertório marcantemente restrito de atividades e interesses. As manifestações do transtorno variam imensamente, dependendo do nível de desenvolvimento e idade cronológica do indivíduo.
De acordo com a fundadora da Associação de Amigos do Autista de Sergipe (AMAS), existem no Estado cerca de 300 autistas, “que precisam de melhorias urgentes na qualidade do tratamento ofertado”. Segundo informações do Jornal da Cidade, a AMAS atende hoje 19 autistas, de 17 a 47 anos, “mas poderia atender muito mais se possuísse uma ajuda financeira constante”.
Símbolo do STF pintado de azul Foto: Blog Psicologia em desfoco |
Para quem quer saber mais sobre o autismo, uma série de eventos e palestrar vão acontecer nas principais capitais brasileiras ao longo da semana. Abaixo você confere alguns deles:
SE – ARACAJU
- Passeio de trenzinho, dia 2/04, a partir das 9h, no bairro Coroa do Meio. Realização: Associação de Amigos do Autista de Sergipe (AMAS)
SP - SÃO PAULO
- Caminhada na Av. Paulista, dia 7/abril, a partir das 9h00. Realização: Movimento Pró Autista e ABRACEI.
- “A realidade do Autismo no Brasil”, uma discussão sobre temas atuais e de fundamental importância para o Autismo no Brasil: “Inclusão e Legislação”. Evento gratuito, dia 5/abril, das 8h30 às 12h00, na Assembleia Legislativa do Estado de São Paulo – Auditório “Paulo Kobayashi”. Informações sobre inscrições neste link. Realização: Autismo & Realidade.
- Encontro do "Movimento Anjos Azuis" no shopping SP Market, dia 23/março.
- Iluminação azul da caixa d'água da Casa de David, dia 2/abril (mais informações. Realização: Casa de David - Centro de Estudo e Atendimento à Pessoa com Autismo.
- Iluminação azul do Palácio 9 de Julho, a Assembléia Legislativa do Estado de São Paulo (Alesp), dia 2/abril
- Iluminação azul do Bar Aurora e o Boteco Ferraz, dai 2/abril.
- Encontro sobre Autismo ,a Câmara Municipal de SP, dia 20/abril, com diversas palestras, das 9h00 às 17h00. Apoio: Crosp, Unicsul, Revista Autismo. O evento será transmitido ao vivo pela TV Câmara.
RJ - RIO DE JANEIRO
- Cristo Redentor estará iluminado de azul
- Projeto Acesso à Cultura para os Autistas, no CCBB - Centro Cultural Banco do Brasil, dia 2/abril, às 9h00, com participação das crianças da AAPA no projeto Musicando e da exposição Movie-se: No Tempo da Animação. Realização: AAPA
- Evento Práticas e Reflexões, como tema Üm Novo Conceito Familiar — Aceitação e Superação Pós-Diagnóstico, no CCBB – Centro Cultural Banco do Brasil, dia 6/abril, às 9h00. Realização: AAPA
- Trilha na Floresta da Tijuca: Trilhando Caminhos em Prol do Autismo com o grupo "Trilhas dos Amigos", dia 6/abril, às 14h00. Realização: AAPA
CE - FORTALEZA
Dia 2/abril, 14h30 – Audiência Pública na Câmara Municipal de Fortaleza (R. Dr. Thompson Bulcão, 830 - Conjunto Luciano Cavalcante, Fortaleza - CE, 60810-460).
Dia 5/abril, 15h00 – Ato público na Praça do Ferreira (Centro de Fortaleza).
Dia 10/abril, 15h00 – Roda de Conversa na Fundação Projeto Diferente (Rua José Vilar, 938 – Aldeota, Fortaleza – CE, 60125-000). Realização dos eventos: Casa da Esperança, Projeto Diferente e ABRAÇA.
MG - BELO HORIZONTE
"Deficiência em Debate", palestrante: dr. Romeu Kazumi Sassaki, sobre políticas públicas para atendimento à pessoa com Transtorno do Espectro Autista (TEA), e os direitos da pessoa com deficiência, no Auditório Universidade FUMEC - Rua Cobre, 200 - Cruzeiro, dia 2/abril. Realização: Prefeitura de Belo Horizonte e entidades.
PE - RECIFE
- Campanha de Sensibilização nas Escolas, Divulgação nos meios de comunicação, Iluminação azul na Torre da Rede Globo (Rua da Aurora), OAB e Tribunal de Justiça na semana de 1 a 7/abril. Realização: AMA-Getid.
- Ação de Cidadania no Parque 13 de Maio, dai 2/abril, às 17h30. Realização: AMA-Getid.
- Caminhada Azul (Parque Dona Lindu até o 2º Jardim de Boa Viagem), dia 6/abril, às 15h30. Realização: AMA-Getid.
*Com informações da Revista Crescer e do Jornal da Cidade.
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