terça-feira, 17 de julho de 2012

A contradição entre a saúde de um povo e a vontade dos grandes empresários

Pela primeira vez a América Latina sediará o Congresso Mundial de Ciência e Tecnologia de Alimentos. Em sua 16ª edição, o evento - que teria "como objetivos promover oportunidades de cooperação internacional, troca de informações e discussões entre cientistas e especialistas de alimentos de todo o mundo" - será realizado entre os dias 5 e 9 de agosto, em Foz do Iguaçu, no estado do Paraná. 

O tema "obesidade infantil" foi banido do evento 
No entanto, o que parece ser uma ótima oportunidade para abordar o problema da alimentação em todo o mundo camufla em si mesmo uma gritante contradição. Um dos debates programados para o evento foi cancelado. A mesa, que abordaria o preocupante "papel da mídia em relação à obesidade e a polêmica regulamentação da publicidade voltada às crianças"*, foi abortada pela professora da Faculdade de Engenharia de Alimentos (FEA) da Unicamp e presidente do congresso, Glaucia Pastore, sob a alegação de que o tema "causaria inconvenientes com os potenciais patrocinadores".


Ora, discutir a segurança alimentar é também procurar meios de solucionar os problemas referentes à saúde e à fome de uma população e das relações entre os povos. A partir do momento em que todas as pessoas no mundo inteiro têm acesso a uma alimentação suficiente, segura e nutritiva, muito avançaremos em relação às desigualdades existentes, refletidas em disparidades como o alto índice de crianças desnutridas nos países africanos e milhares de crianças obesas nos Estados Unidos, grande império do fast-food.

Se não temos a liberdade de abordar um tema tão preocupante e fundamental quanto a obesidade infantil, de que vale esse evento senão para movimentar dinheiro? Se a posição dos patrocinadores é mais importante do que combater a obesidade infantil, quem vai ser mais beneficiado com esse evento?

Os pesquisadores que terão a oportunidade de divulgar seus trabalhos, a população que sofre com as desigualdades sociais em diversos países ou as grandes empresas que já lucram o bastante com essas desigualdades?

O evento será sediado no Brasil, mas enquanto estudiosos e empresários do mundo inteiro fingem que estão preocupados com a segurança alimentar e enchem os bolsos de dinheiro, cerca de 10% das crianças e adolescentes brasileiros possui sobrepeso e 7,3% sofre de obesidade (de acordo com o IBGE). 
Glaucia Pastore, pesquisadora e presidente do Congresso
Será que a Glaucia Pastore (visivelmente acima do peso) sabe que o parlamento inglês quer banir o patrocínio de empresas como o MCDonald´s e a Coca-Cola nas Olimpíadas? Segundo os parlamentares, Londres já teria contabilizado 30% das crianças e 60% dos adultos acima do peso.

A diferença entre ambas as situações certamente está na preocupação central: a saúde da população x dinheiro dos patrocinadores de um evento com credibilidade duvidosa. 

* Informação publicada na coluna "Plural", de Rosângela Dória, no Jornal Correio de Sergipe.


quinta-feira, 5 de julho de 2012

Parto cesáreo: um crescimento que preocupa


Meu parto foi cesáreo e até hoje me pergunto se foi uma decisão correta. Lógico que ter minha filha viva e com saúde é mais importante que o tipo de parto a que me submeti. Mas ela foi retirada de meu útero tão fragilizada que parecia estar desmaiada. Passou a noite entubada para receber oxigênio e somente 10 horas após o parto, no dia seguinte, eu peguei minha filha pela primeira vez e amamentei.

E lembro que, no momento, uma das profissionais da equipe de saúde apoiou seu corpo sobre minha barriga para que minha filha pudesse ser retirada. É claro que na hora eu senti aquele gesto como invasivo e agressivo. Mas, em um momento de vulnerabilidade (como o do parto), pacientes sempre se questionam, se incomodam com alguma coisa, mas não sabem exatamente o que é normal e o que não é. É muito difícil questionar uma equipe médica.

O primeiro pediatra de Maria Joana, ao ouvir o relato sobre o parto, disse que crianças que são "forçadas" a sair antes do momento certo (como acontece no parto cesáreo anteriormente marcado) geralmente nascem fracas, porque não se esforçam como no parto normal. Vários médicos afirmam coisas diferentes, mas essa informação do pediatra me fez refletir bastante.

Hoje vemos que é muito comum os médicos induzirem - de forma invasiva, muitas vezes - as mães a realizarem o parto cesáreo. Sem sequer iniciar o procedimento natural. 

O fato inclusive preocupa o Ministério da Saúde, que aponta um crescimento no número de cesáreas no Brasil - em 2009, a proporção de partos cesáreos foi de 50%, enquanto em 2010 o número desse tipo de procedimento foi maior do que o normal. Em 2011, a taxa chegou a 52%.

Nas maternidades privadas, o índice chega a 82%!! E na rede pública, 37%. Mesmo assim, 37% não é pouco. A Organização Mundial da Saúde (OMS) recomenda que as cesarianas não ultrapassem os 15% do total de partos. Mas em Sergipe, quase 25% dos partos realizados nos cinco primeiros meses deste ano foram cesarianas, de acordo com dados da Atenção Hospitalar da Secretaria de Estado da Saúde (SES). Foram 1.496 partos cesáreos em maternidades da rede pública e privada, de um total de 6.322.  

Para tentar compreender porque cada vez mais brasileiras tem optado pelo parto cesáreo, a Escola Nacional de Saúde Pública da Fiocruz, ligada ao Ministério da Saúde, realiza a pesquisa "Nascer Brasil: Inquérito sobre Parto e Nascimento", através de entrevistas que serão realizadas com 24 mil mulheres que pariram recentemente.

Claro que não se trata de extinguir o parto cesáreo como alternativa médica. Mas de diminuir o número de procedimentos desnecessários e alertar as mães para a situação em que vivemos, onde obstetras preocupam-se cada vez mais com o valor monetário do parto e com a comodidade de realizar um parto com data e hora marcadas. Mas quem sofre na pele pela comodidade do obstetra são a gestante e o bebê.


Obs.: Com informações e dados do Jornal da Cidade desta quinta, dia 05/07.

segunda-feira, 2 de julho de 2012

Aprendendo o ritmo natural das coisas

Acompanhar e participar do desenvolvimento da criança é muito gostoso. A cada semana, a cada mês ela coloca em prática os novos aprendizados e fica atenta, observando a reação de todos ao redor. Hoje Maria Joana tem perfeita noção de quando reprovamos ou estimulamos alguma atitude dela.

Se antes eu sentia que ela percebia a situação pelo nosso tom de voz, hoje eu percebo que ela entende perfeitamente as palavras. Mesmo que não as repita integralmente, ela sabe localizar os objetos quando falamos o nome sem apontar, entende que é hora de arrumar os brinquedos na caixa, trocar de roupa, dormir, comer... quando anunciamos "Vamos tomar banho"? ou "Hora de comer", ela prontamente se posiciona para a tarefa. 


À medida que a criança cresce e seu desenvolvimento mental facilita o diálogo e a compreensão, percebo que ela adquire mais noção de respeito ao ritmo natural das pessoas e das coisas. Quando os gatos estão dormindo ou comendo, ela tende a se afastar mais do espaço deles - pelo menos na presença de um adulto.

Ela entende que, quando fechamos a torneira, não há mais água para o banho (e não chora mais); quando alguém sai de casa, vai ao banheiro ou dorme, ela não chora mais como se as pessoas tivessem que estar com ela sempre que ela quer. Ela se contenta com "Fulano está no banho, vem já", "Cicrano foi fazer xixi", "Papai saiu, mas volta" etc. Ouve, faz cara de quem compreendeu e espera. Vai se distrair com outra coisa.


Não tem mais o mesmo 'desespero' quando as coisas não são do jeito que ela quer ou quando as pessoas não agem como ela quer. Lógico que às vezes ela reclama, mas percebo que, quando dialogamos, ela tende a ser menos intransigente.

Acho importante estimular esse respeito desde cedo nas crianças. Respeito à natureza, às pessoas, às atividades, aos coleguinhas, aos animais. Ensinar que tudo tem o seu ritmo natural é difícil - e estressante, por muitas vezes. Sinto-me como se estivesse o tempo todo regulando, o tempo todo brigando ou contrariando as vontades dela.

Mas entendemos que, como ela tem a personalidade forte, esse aprendizado pode evitar que ela se torne uma pessoa umbiguista, cheia de vontades, incompreensiva e 'dona' de espaços que, na verdade, não são dela. Mas é claro que ela tem que sentir que há respeito da nossa parte também.


Entender que ela tem seus momentos de bom humor, de não querer conversar, de não querer assistir televisão, de querer brincar sozinha ou comer é o nosso papel. Quando ela percebe que tem seu espaço e seu momento respeitados, o diálogo tem mais abertura. 

São exercícios de troca que valem a pena!