segunda-feira, 18 de fevereiro de 2013

Obesidade: um problema que não tem graça

Crianças com obesidade e sobrepeso no mundo
Por muitos anos, diferentes gerações alimentavam de maneira desenfreada suas crianças, exaltando o mito de que a criança gordinha é linda. Por incrível que pareça, ainda há quem pense dessa forma, mas as pesquisas atuais mostram a gravidade a que chegou o problema da obesidade infantil no mundo inteiro. De acordo com o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), nos últimos trinta anos, o índice de sobrepeso entre crianças de cinco a nove anos aumentou mais de 200%. Ainda segundo o instituto, cerca de 33,5% das crianças brasileiras sofrem de sobrepeso ou obesidade.

Em vários países, pela primeira vez na história da humanidade, crianças apresentam sintomas de doenças de adultos: problemas de coração, respiração, depressão e diabetes tipo 2. Essas e outras nuances da obesidade infantil são destacadas no documentário “Muito além do peso”, sob direção de Estela Renner e produção de Maria Farinha Filmes (mesma equipe de produtores do vídeo “Criança, a Alma do Negócio”). Na película, é possível acompanhar casos alarmantes de crianças que sofrem sérias sequelas da obesidade, além de observar detalhes presentes na rotina da criança que contribuem para esse quadro angustiante. 

Publicidade


A publicidade de alimentos para crianças seria um fator responsável pelo crescimento assustador dos índices de obesidade infantil? O debate coloca, de um lado, a indústria de alimentos e suas guloseimas e, do outro, as organizações de direito do consumidor e sociedades médicas.  No Brasil, já existe controle sobre a propaganda de publicidade e de bebidas, mas não há uma legislação específica para a publicidade de produtos infantis, o que causa preocupação em diversos setores da sociedade. Durante o vídeo em questão, são exibidos vários relatos de crianças que compram e consomem determinados alimentos da categoria fast-food ludibriados pela propaganda. 

“Nós temos relatos de mães e pais que dão refrigerantes para os filhos menores de um ano na mamadeira. Mas eles não sabem a gravidade do que estão fazendo. Ela imagina que, se aquele produto existe, se há uma propaganda regulamentada, se aquilo está associado ao bem-estar e ao sucesso, por que ela iria imaginar que seu filho não deve consumir aquilo?”, alerta o pediatra Fábio Lopez, vice-presidente da Sociedade Brasileira de Alimentação e Nutrição. 

Para o deputado Salvador Zimbaldi (PDT-SP), relator do Projeto de Lei 5921, que tramita há mais de 10 anos na Câmara dos Deputados e que pretende proibir a publicidade destinada a vender produtos infantis, o Conselho Nacional de Autorregulamentação Publicitária (Conar) tem sido ineficaz na fiscalização das agências publicitárias do país. “Hoje, estamos convivendo com a população infantil obesa, por conta do consumismo, do sedentarismo. O que queremos, na verdade, é buscar um meio termo para que a propaganda não venha a ser restrita, mas, por outro lado, também não haja um incentivo, um estímulo absurdo ao consumo, conforme estamos vivenciando hoje”, afirma o parlamentar. Uma pesquisa realizada pelo Instituto Alana já mostrou que a criança tem influência sobre as compras gerais da casa em cerca de 80%.

Alimentos industrializados

De acordo com pesquisa realizada pela Universidade Federal de São Paulo (Unifesp), cerca de 56% dos bebês tomam refrigerantes antes do primeiro ano de vida. No mesmo filme, “Muito além do peso”, é possível perceber centenas de crianças que tomam Coca-cola todos os dias. No entanto, os próprios pais dessas crianças se surpreendem quando descobrem que, ao final de um mês, seus filhos ingerem cerca de 1,110 kg de açúcar somente com o refrigerante. 

Nos supermercados, é comum observar crianças comendo cheetos, enlatados, tomando refrigerantes e consumindo outros industrializados, tudo com a conivência dos pais, na maioria das vezes ingênuos quanto à gravidade do consumo desses alimentos. “Se nós apontarmos alimentos específicos responsáveis pela obesidade, o primeiro da lista são as bebidas açucaradas: refrigerantes e sucos industrializados. Nas crianças, isso significa um acréscimo de 250 kcal por dia. É uma quantidade pequena em excesso de calorias que contribui para a obesidade”, destaca o diretor da Divisão de Nutrição, Atividade Física e Obesidade do Centro de Prevenção e Controle das Doenças dos Estados Unidos, William Dietz, durante o filme. 

Na mesma película, as crianças são unânimes nas preferências pelos industrializados e no desconhecimento quanto às frutas, verduras e legumes. Nesse sentido, os profissionais chamam a atenção para a responsabilidade dos pais. “Há muitas coisas que eles podem fazer. A comida de verdade precisa fazer parte do nosso cotidiano. Precisamos fazer compras com as crianças, cozinhar com as crianças, plantar com elas. A comida precisa se tornar um valor central, precisamos comer junto com elas. Os pais podem diminuir o horário que as crianças passam em frente à TV e estimulá-las a brincar. Nós temos que resgatar essa parte das nossas vidas. Enquanto a situação continuar do jeito que está, veremos situações de obesidade e diabetes dispararem”, afirma a chef, escritora e educadora Ann Cooper, diretora do Projeto “School Food”, nos Estados Unidos. 

*Texto originalmente publicado na coluna sobre maternidade, no Jornal da Cidade de domingo, 17/02.

2 comentários:

  1. Acredito que não só a criança obesa deve ser alvo de maiores cuidados em relação a sua alimentação, muitas vezes a criança é magra, mas tem baixa qualidade nutricional em sua alimentação. A fiscalização da publicidade seria um passo para melhora desse quadro, pois acredito que elas tem um poder bastante eficaz no que diz respeito a induzir a criança ao consumo de comidas industrializadas. No entanto, o papel dos pais é de extrema importância, já que eles enquanto adultos com maior capacidade reflexiva, deveriam estar atentos ao que oferecem a seus filhos. Talvez, num ato de buscar praticidade, não se pensa nas consequências dessa proposta de alimentação em pacotes. Acredito que pode existir um meio termo, como separar dias na semana para consumir alimentos industrializados e nos outros prezar pelo consumo de alimentos saudáveis.

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  2. Eu até acredito na responsabilidade dos pais, no tocante à criação dos filhos. Mas, acredito que a matéria serve de alerta para uma questão mais ampla. Não é nuclearmente, de casa em casa, junto aos pais que se resolve um problema de caráter global.

    A lógica do consumo, superestimulada pela propaganda, realmente quer ganhar mais adeptos e nada melhor que crianças para manter o ciclo.

    Seguindo a tangente, a pesquisa que relata que 80% das compras da casa têm influência das crianças não só assusta a uns, como é utilizada por outros para direcionar a propaganda ao seu otimizado público-alvo.

    Há uma indústria e seu esgoto criados para gerar esse tipo de abuso, que posteriormente alimentará a indústria farmaceutica - para tratar da diabetes, da pressão alta e tantos problemas consequentes da má alimentação -, dentre outras indústrias.

    É o sistema se retroalimentando. Então, no fim das contas, os pais que foram criados e também criam esse sistema são quase uns "sem chance", nessa luta. A insurreição deve ser maior do que o já árduo trabalho de tentar educar os filhos nesse mundo doente!

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