quinta-feira, 21 de novembro de 2013

Tirem suas normas da nossa cabeça!

Desde o momento em que nascemos, aprendemos a nos adequar a uma série de imposições estéticas, reafirmadas principalmente pela família. O corpo deve ser afinado, o cabelo deve ser alisado, o rosto deve ser maquiado e por aí vai. Muitas de nós se adequa facilmente e passa a vida sem questionar nenhum desses padrões, gastando cada vez mais tempo e dinheiro para mantê-los. Por outro lado, muitas não conseguem (e não querem) se adaptar e passam a vida acumulando uma série de frustrações, angústias e baixa autoestima. Não só a família, como também os desenhos animados, e vários outros produtos midiáticos que fazem parte de nossa infância ajudam a construir identidades frustradas, consideradas fora da normalidade. 

Um elemento aparentemente sem importância, mas fortemente regulado e constantemente disciplinado no corpo feminino é o cabelo. O tempo todo aprendemos como "baixar o volume", como "domar os cachos rebeldes", como "transformar os fios crespos em lindos cabelos lisos", em dar mais "praticidade" ao cabelo. E então nos é apresentada uma série de químicas e chapinhas "milagrosas" que prometem transformar nossa cabeça em um outdoor, que tem como única função propagandear todo o mercado cosmético que nos oprime a todo momento. 

Aprendemos desde cedo que o cabelo crespo é "ruim", é "feio", é "volumoso", "feio", "assanhado" e que dá muito trabalho. A solução? Alisar! Incorporamos essa lógica de uma maneira tão forte que passamos a nos preocupar com aquele fio que não fica no lugar, com aquele volume todo, com os cachos que estão fora do padrão etc. Há poucos dias, acompanhamos a marginalização que a novela "Amor à Vida" tem destinado ao cabelo rasta. Acompanhamos diálogos fortemente preconceituosos com relação ao novo penteado da personagem Paulinha (e olhe que aquelas tranças não são jamais um dreadlock, como anunciado pelo diretor da novela).


Acredito na maternidade como um ato político e por isso decidi que não iria reproduzir com a minha filha as mesmas imposições das quais fui vítima e que por muito tempo ajudei a compartilhar ao meu redor. Como já esperávamos, devido à mistura étnica, minha filha nasceu com o cabelo cacheado e os fios grossos. Difícil de "domar", como costumam dizer de maneira normativa. Sim, já ouvimos dicas de como "baixar o volume", dos melhores cremes para "domar os fios" etc. Não, obrigado. Recusamos todas. Desde cedo compramos faixas e presilhas que ajudam a fortalecer os cachos e a deixá-los mais soltos ainda. E, como eu acho que não seria diferente, minha filha adora os cabelos cheios e soltos. Selvagens.

Diante da cena bizarra em que a Paulinha aparece com o novo penteado em casa e é fortemente rechaçada pelo pai, perguntei a minha filha se ela achava o penteado bonito. Como eu esperava, ela disse que sim e que gostaria de ter um igual. Levei-a à Oficina de Penteados Afro, organizada pelo Coletivo de Mulheres de Aracaju (do qual faço parte) no Dia da Consciência Negra. Mas ela logo deu sinais de uma virose e não se sentiu bem, tivemos que voltar para casa.

A oficina foi um sucesso e muitas pessoas transformaram sua visão com relação ao próprio cabelo. Uma delas é a Brisa que, depois de tantos anos de química destruidora, resolveu assumir a negritude e finalmente desenvolver uma relação de amor e autoafirmação com seus cabelos. Mais do que um enfeite ou um elemento estético, o cabelo é um instrumento de reafirmação identitária e é apenas uma das armas que continuaremos utilizando contra uma sociedade preconceituosa, racista e normativa. 

Brisa e seu retorno às origens. Mais bela e mais feliz!



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