Depois do acidente, a garotinha "perdeu a visão do olho direito, quebrou a mandíbula, o queixo e o nariz e teve cortes profundos na bochecha". Depois de uma tragédia como essa, o que resta à família de uma criança de três anos além de acompanhar os tratamentos e procedimentos cirúrgicos necessários à recuperação física e psicológica da menina? Retomar aos poucos a rotina, suponho. O cotidiano de uma criança de 3 anos, que está fortalecendo vínculos com a família, parentes e amigos, começando a descobrir o mundo, as pessoas, a maneira como as coisas funcionam e o que pode lhe trazer prazer, suponho eu como mãe.
![]() |
A pequena Victoria |
Segundo matéria de O Globo, "Victoria saiu com a sua mãe para jantar em um restaurante da rede de fast food KFC. Após ter de tomar chá gelado e ingerir purê de batata por um tubo, a menina foi interpelada por um funcionário do estabelecimento, que pediu para que as duas se retirassem do local. O motivo, segundo ele, era que a cena estava "incomodando" outros clientes".
Eu não estava lá para ver a cena, mas duvido que existisse ali algo além de uma cena familiar, em que uma mulher ajuda a sua filha de 3 anos recém-operada a comer, porque é óbvio que isso requer mais cuidado do que o usual. Pode até ser uma cena inusitada ou que chame a atenção, mas o olhar "assustado" que se parece direcionar a uma criança recém-acidentada e operada denuncia a maneira como boa parte de nós ainda vê outros seres humanos com limitações físicas - de maneira inquisidora, como se estivesse diante de uma "aberração", uma coisa "abjeta", "não-humana". E que por tudo isso, "deve estar longe de meus olhos e da minha presença".
Quem de nós pensa o quanto é duro para uma mãe ter que explicar à sua filha que as pessoas querem ela longe dali porque é assustador que ela tente retomar a sua rotina e seus hábitos na frente daqueles que se acham perfeitos ou livres de qualquer limitação física, de qualquer deformação que possa vir a ocorrer após um acidente? Assustador é que, ao invés de a empresa, através do funcionário, ter ido interpelar a família para expulsá-la do local, não tenha questionado se havia ali a necessidade de um atendimento especial ou personalizado, ou se elas precisariam de mais alguma coisa além o que já havia sido oferecido como atendimento.
Então vemos questionamentos do tipo "Se a menina estava com o rosto daquele jeito, por que a mãe não pediu comida por telefone e comeu com ela em casa?". Será que é essa a pergunta que devemos nos fazer? Quando vejo esse tipo de reação a um episódio como esse, constato que é cada vez mais difícil a luta de quem tenta viver e criar filhos em meio a uma humanidade tão desumana e tão desanimadora.
Nenhum comentário:
Postar um comentário