quinta-feira, 10 de julho de 2014

Entre os prazos e o prazer

Férias escolares já virou sinônimo de dor de cabeça. Não que seja ruim, desagradável ou algo parecido o fato de seu filho ficar mais tempo em casa. Ao contrário, é uma oportunidade de dormir juntinhos até mais tarde, assistir mais animações com pipoca, passear um pouco mais, conhecer uns lugares, revisitar outros, conversar mais etc. O problema é que, como diz meu sobrinho de 8 anos, os pais não tiram férias ao mesmo tempo que os filhos.

Minha filha ficou de férias por um mês e exatamente no último mês que tenho pra preparar o texto da qualificação de mestrado. Exatamente no mês de provas do papai na faculdade. Resultado: renovação do estoque de desenhos e animações, enquanto a mamãe passa mais horas que o de costume no computador, tentando se concentrar em meio ao caos de uma criança de 3 anos que fica o dia todo em casa.

Me sinto mal por não conseguir cumprir os prazos de leitura e escrita como eu gostaria, me sinto mal por não ter tempo/dinheiro pra tirar minha filha da rotina em plenas férias, ir à praia, ao cinema, ao oceanário, visitar os amigos que têm filhos da mesma idade etc. Enfim, pedimos desculpas aos filhos por não presenteá-los com uma viagem de férias ou uma programação divertida no mês de julho, mas no fundo sabemos que cumprimos prazos, obrigações, compromissos, regras e cobranças que não estão ao nosso alcance.

Muitas vezes agimos como o personagem Guido, do filme "A vida é bela", tentando camuflar a realidade pra que eles não percebam as dores e os dilemas da vida real, as pressões do mundo adulto. É frustrante perceber a dificuldade entre conciliar os compromissos de estudo e trabalho e os desejos e demandas dos nossos filhos. Parece até pedir demais, porque aprendemos desde cedo que o "natural" é trabalhar 10 horas por dia e reservar os finais de semana para o prazer, o lazer.

Quando eu era criança, meu pai sempre estava trabalhando. Quando estava em casa, estava cansado do trabalho e tínhamos que deixá-lo em paz. Não conversávamos, não brincávamos, não interagíamos. Interagíamos aos domingos, nos jogos do Flamengo. Era a oportunidade de receber um pouco de atenção. Era ótimo assistir ao jogo do Flamengo, porque ele me explicava tudo e até vibrávamos juntos. Era o momento de ver meu pai sorrindo e conversando. Minha mãe sempre tinha muitos pratos pra lavar, roupas pra cuidar e, quando se sentava pra assistir à novela, dormia. Dormia de tão cansada. E pra não levar bronca, era melhor deixar dormir.

Desde que minha filha nasceu, sempre pensei que poderia fazer diferente. O mercado de trabalho me consumia, eram 12 horas entre um emprego e outro. Por alguns meses, ela passava mais tempo com o pai e com a avó do que comigo - não estamos falando de um ranking, mas via o tempo passar e não queria perder o crescimento de minha filha, momentos que não voltam. "Vou parar de trabalhar e tentar um mestrado, assim volto a estudar e fico mais tempo em casa". Apesar do aperto financeiro, foi a melhor decisão. Pessoalmente, estou realizada de voltar à universidade e perceber que posso passar menos tempo sendo robô e mais tempo aprendendo, lendo, estudando, sentindo que a caminhada segue para algum lugar. Passei a estudar para concurso e os frutos já estão brotando - algo impensável em outras épocas.

Mas é muita coisa pra ler, muita coisa pra estudar e escrever. Na primeira semana de férias, eu surtei. Logo vi que não conseguiria cumprir os prazos e fazer o que tinha estabelecido como meta pra mim mesma. Estressei e acabei colocando as mãos na cabeça. Quer saber de uma? Dane-se. Separei quatro horas por dia pra estudar tudo o que tinha que estudar e, como vi que não era possível ainda assim cumprir a meta, elenquei prioridades e agilizei meu próprio ritmo.

E assim estamos, dormindo até mais tarde, almoçando tarde, passando mais tempo no parquinho, conversando bastante, passeando de bicicleta e fazendo bobagens. Dessas que sonhamos em ficar fazendo om os filhos quando trabalhamos 10 horas por dia. Sei que poderia estar mais avançada na pesquisa, mas não parei de escrever. Apenas parei de me cobrar tanto. Próxima semana as férias acabam e é hora do "intensivão". Tenho duas semanas sozinha em casa. E já me sinto como Demi Moore em "Além do Limite da Honra" - me preparando pra guerra.


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